O
escritor Jack Kerouac gostaria de ter visto Marlon Brando no papel do lendário
herói apaixonado Dean Moriarty na adaptação para o cinema de seu livro "Pé
na estrada" ("On the road"). Mas a obra demorou mais de 50 anos
para chegar às telas, num dos "desenvolvimentos" mais longos da
história do cinema.
Dirigido
pelo brasileiro Walter Salles, "Na estrada" estreia em Cannes nesta
quarta-feira (23) na disputa pela Palma de Ouro. "Um livro lendário,
gerações inteiras que são projetadas nos seus personagens: o erro era
proibido", declarou o produtor Natanael Karmitz (MK2), que abraçou o
projeto depois de uma "dúzia de tentativas fracassadas".
Inicialmente,
os direitos foram adquiridos em 1978 por Francis Ford Coppola, que
posteriormente o ofereceu para, entre outros, Jean-Luc Godard e Gus Van Sant.
Seu filho Roman também tentou, sem sucesso, enfrentar o desafio.
Segundo Karmitz, dois grandes obstáculos estavam no
caminho de "Na estrada" para o cinema: contar "histórias de
sexo, drogas, energia e encontros, sem nenhuma narrativa linear, o que é muito
diferente das armas usadas pelos estúdios americanos" e filmar um "road-movie histórico"
numa América modelada em torno de shoppings.
Com "Diários de motocicleta" (2004), que
narrou a viagem de Che Guevara pela América do Sul, Walter Salles se
transformou no "mestre do road-movie e
dos filmes complexos", sorri o produtor, apadrinhado por Coppola, que o
descobriu no Festival de Sundance.
Salles
refez três vezes o caminho de "Na estrada", de leste a oeste de Nova
York até São Francisco, atravessando o México, para mergulhar em seu universo,
conhecer os últimos protagonistas ainda vivos e aumentar seu interesse pela
história do jazz. Foram "três anos de procura e pesquisas, que ele filmou
como um documentário" antes de escrever o roteiro, conta Charles Gillibert,
cúmplice de Natanael Karmitz na produção.
O diretor brasileiro Walter Salles e o ator Viggo Mortensen conversam no
set do longa 'Na estrada' (Foto: Divulgação)
"Ele
entrou no mundo do livro, sua imaginação, sua música, não fez mais nada além
disso. No início de 2009 já tinha um roteiro sólidol." Uma aventura, não
uma reconstituição. Ainda sobre a produção do roteiro, Karmitz acrescenta:
"Parecia-nos impossível, mas acreditamos muito!".
O
projeto, assinado em Los Angeles em janeiro de 2010 e concluído em maio em
Cannes com os coprodutores europeus, foi realizado com um orçamento de 25
milhões de euros e filmado durante o verão. Os atores foram escolhidos logo no
início, mas "Garrett Hedlund recusou por dois anos", enfatiza
Gillibert. Enquanto isso, a carreira de Kristen Stewart
("Crepúsculo") explodiu.
"Walter
Salles trancou os atores em um loft em Montreal, em julho, uma espécie de
acampamento para acostumá-los a viver juntos, para que esta energia fluísse
naturalmente nas telas", segundo Gillibert. As filmagens começaram em
agosto com suas complicações, "a América dos anos 40 não existe mais, um
terço dos lugares foram decididos durante as filmagens. Foi uma aventura, não
uma reconstrução".
Arizona,
Novo México, Canadá, Califórnia, México. Procuraram a neve dos invernos
canadenses na Argentina, em Bariloche, levando o "Hudson" de
colecionador, o carro da equipe selvagem. "A única maneira de dar tudo
certo, era ter um chefe [o cineasta francês Eric Gautier] que conseguiu
trabalhar com os meios à mão e os atores que, apesar de sua fama, estavam
prontos para essa aventura", acrescenta Charles Gillibert. "Este
livro mudou a vida de muitas pessoas, o filme fez o mesmo."
G1
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