Em um duro revés para o governo do novo presidente do Paraguai, Federico Franco, a Venezuela anunciou neste domingo que vai interromper o envio de petróleo ao país. O presidente Hugo Chávez ainda ordenou a retirada do embaixador venezuelano em Assunção – Brasil, Argentina e Uruguai também convocaram seus diplomatas instalados na capital. Enquanto isso, o presidente destituído do Paraguai, Fernando Lugo, anunciou que vai à cúpula do Mercosul, na próxima quinta-feira.
– Vamos suspender o envio de petróleo, porque não vamos apoiar de forma alguma esse golpe de Estado. A partir deste instante, o ministro (Rafael) Ramírez tem ordens para cessar o envio de petróleo para o Paraguai – afirmou Chávez durante comemoração do Dia do Exército, segundo o site venezuelano "El Nacional".
O governo paraguaio, entretanto, afirma que não há motivo para alarme. Sergio Escobar, presidente da Petropar – a petroleira estatal do Paraguai –, disse que o país conta com 130 mil metros cúbicos de combustível em estoque, o que garantiria uma provisão por dois meses. Ao jornal paraguaio "ABC", Escobar afirmou que o petróleo comprado da PDVSA, a estatal venezuela, representa cerca de 30% do mercado paraguaio.
O país ainda tem contratos vigentes com outras duas empresas: a Trafigura, que garante 70 mil metros cúbicos por mês, e Petrobras, que provê 32 mil metros cúbicos mensais. O setor privado ainda conta com 25 mil metros cúbicos em estoque, segundo Escobar.
Argentina, Venezuela, Bolívia, Equador, Nicarágua e Cuba já disseram não reconhecer o novo governo paraguaio. Peru e México questionaram a rapidez do processo de destituição de Lugo, mas o México reconheceu a legalidade do processo. Um pouco mais distante, o Canadá se limitou a dizer que Lugo aceitou a sua saída e pediu calma no Paraguai.
Lugo afirma que vai à Cúpula do Mercosul
Em entrevista na tarde deste domingo, Lugo afirmou que pretende participar da cúpula do Mercosul na cidade argentina de Mendoza, para representar o país. Ele informou que está analisando a possibildiade de realizar em conjunto a cúpula da Unsasul – que reúne 12 países da região – e do Mercosul. Com isso, ele pretende entregar na ocasião a presidência da Unasul, hoje a cargo do Paraguai, ao presidente do Peru, Ollanta Humala.
– Vamos estar na próxima semana no Mercosul – disse Lugo na porta de sua casa. – Como vocês sabem, o Paraguai exerce a presidência rotativa da Unasul, o próximo a assumir é o Peru, entramos em contato com o presidente Ollanta (Humala), vamos adiantar esta transferência também para a próxima semana.
Lugo disse ainda que reconheceu a validade do impeachment, aprovado na sexta-feira, para evitar consequências mais graves ao país. Ele repetiu várias vezes que o processo denominado “juízo político”, segundo a Constituição paraguaia, foi conduzido de forma ilegítima.
– Estamos com a certeza de que houve um golpe de Estado contra a vontade popular. Não há dúvidas sobre isso – destacou.
Brasiguaios vão pedir que Brasil reconheça novo presidente
Segundo o site paraguaio ABC Color, os brasiguaios vão se reunir nesta segunda-feira com o cônsul brasileiro em Ciudad del Este para solicitar que Franco seja reconhecido como presidente legítimo e que o país não sofra restrições. São cerca de 600 mil brasiguaios no Paraguai, que representam 90% da produção e exportação de soja do país. Uma das primeiras providências de Franco após assumir o poder foi anunciar um tratamento especial para o grupo.
Hermes Aquino, da Coordenadoria Agrícola do Paraguai, acusou a Unasul de ter imposto obstáculos econômicos ao país durante anos e de agora se intrometer nos assuntos internos paraguaios. Ele culpa Lugo pela morte de 17 pessoas na semana passada, episódio considerado o estopim para sua destituição.
– A única coisa que vieram fazer é pressionar para manter no poder seus amigos de esquerda e não perceberam que o juízo político foi feito de acordo com a Constituição Nacional - afirmou Aquino ao ABC Color.
Lugo faz seu primeiro discurso pós-queda
Um grupo de manifestantes protestava em frente ao prédio da TV Pública, no centro de Assunção, quando o Lugo desceu do carro em direção à multidão, no início desta madrugada. Sorridente, acenou para cerca de 500 pessoas, se aproxiimou do pulpito e abriu o pronunciamento explicando os motivos que o levaram a acatar pacificamente a decisão do Congresso, que o tirou do poder a nove meses de uma nova eleição presidencial.
– Aceitei o resultado desse injusto julgamento político para que não houvesse derramamento de sangue. Foi pela paz - disse ele, aplaudido pelas centenas de apoiadores que cercavam o prédio da emissora em protesto às informações de que o setor de comunicação do novo governo já teria dado sinais de que pretendia usar o canal politicamente.
Acompanhado por três seguranças, Lugo admitiu que são mínimas as chances de retomar o poder. Para o ex-mandatário, náo há outra explicação para seu impeachment, a não ser de que foi vítima de um golpe de Estado em razão de suas políticas sociais para os mais pobres. E acusou diferentes setores por sua destituição.
– A ditadura não é somente militar, mas também parlamentar, do capital, do narcotráfico, da violência, e já não queremos isso. A pátria nos chama a um protesto pacífico, e eu, como cidadão paraguaio, me junto aqui na rua, na praça, no campo, na cidade, não porque se trate de Lugo – disse ele.
O presidente destituído acusou a imprensa nacional de não informar os detalhes de sua defesa “respondendo a seus próprios interesses”, sem especificar do que falava. O diretor da TV pública pediu demissão horas após a destituição de Lugo. Segundo acusam os manifestantes, o governo de Franco estaria tentando controlar a emissora e o conselheiro de comunicações do novo presidente teria ido até a TV na sexta-feira para pedir o quadro de programação.
Sobre o novo presidente, o antigo bispo disse que ele terá o desafio de mostrar-se capaz a resistir ao bloqueio anunciado pelos países vizinhos:
– Os companheiros da Argentina, do Brasil e do Uruguai já chamaram seus embaixadores. Esse governo está isolando o país e vai ser responsável pela pobreza e pelo retorno da ditadura no Paraguai – reforçou ele, convocando seus apoiadores para um movimento pacífico pelo país.
Governo Franco já enfrenta primeiro conflito por terras
Aproximadamente 90 famílias paraguais ocuparam neste domingo uma propriedade rural de brasileiros no distrito de Capiibary. Os paraguaios reivindicam 1900 hectares e denunciam que os donos do local usam produtos químicos em sua plantação que causam danos à saúde dos moradores da região.
Segundo o jornal "Ultima Hora", os invasores alegam tentar comprar as terras há nove anos. Eles esperam que o Franco ajude-os a resolver a situação e promova uma reforma agrária no país.
O Globo
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